terça-feira, 23 de maio de 2017

Eu queria um poema
Forte, intenso
Que me deixasse em êxtase
Que me calasse os sentidos
E me desse a sensação de perplexidade
E gozo
Tudo ao mesmo tempo
Me fazendo muda para sempre

Eu queria um poema
Cortante, lancinante
Tão ácido
Que fosse capaz de derreter
A caneta
E queimar meus dedos

Eu queria um poema
Insano, desbocado
Que me tornasse eternamente nua
Que pudesse me fazer dizer coisas
Que ninguém jamais tenha tido coragem de dizer
Que me permitisse ser:
Nem mulher, nem homem.
Nem viva nem, morta.

Eu queria um poema devasso
Que ninguém tivesse a ousadia
De ler mais de uma vez
Que soubesse dizer todas as verdades
E me poupasse de ser sempre
Tão ponderada
Tão civilizada
Tão previsível

Eu queria um poema
Que me rasgasse ao meio
E me fizesse entender que depois dele
Seria completamente outra
Quisera eu pudesse escrevê-lo
Em papel
Computador
Num pedaço de parede
Ou na porta de um banheiro de rodoviária
No entanto,
Apesar de desejá-lo do fundo do meu ser
Não escrevê-lo me salva a cada dia.

Rita Almeida

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