terça-feira, 26 de agosto de 2008

Nota de pesar pela morte da Casa de Parto de Juiz de Fora.

Por: Rita de Cássia A Almeida
escrito em agosto de 2008

Dentre os inúmeros retrocessos que nosso município tem assistido nos últimos tempos, o fechamento da Casa de Parto da UFJF certamente merece destaque. Engana-se quem acredita que esse ato, amplamente justificado pelo Sr. pró-reitor de planejamento da UFJF, Carlos Elíseo Barral, significa apenas o que parece: a perda de um serviço de atendimento à parturientes. Ao fechar a Casa de Parto nossa política de saúde se fecha, principalmente, para propostas de atendimento que estejam preocupadas com a humanização, a integralidade no atendimento e em romper com a hierarquia dos saberes médicos, em especial com os superespecializados.
Dizer que a Casa de Parto foi fechada por falta de médicos (obstetras, neonatologistas, e outros) é um contra-senso, é o mesmo que dizer que se fechou uma padaria por falta de médico. Nas Casas de Parto são os profissionais da enfermagem, de nível superior e técnicos, os responsáveis pela condução dos trabalhos. Os assistentes sociais, psicólogos, fisioterapeutas e outros profissionais da saúde também podem compor a equipe. Esqueceram de dizer que a grande inovação que as Casas de Parto oferecem é exatamente a de prescindirem da intervenção do médico, pois pretendem resgatar o parto natural, assistido pela família, sem procedimentos invasivos e cirúrgicos.
Há bem pouco tempo eram as mulheres que detinham o saber sobre a gravidez, o parto e a maternidade. Eram as parteiras e não os médicos que sabiam o segredo de fazer uma criança vir ao mundo. Aos poucos, tais saberes foram expropriados pela medicina a ponto de hoje, para a grande maioria, ser inconcebível um parto sem a presença de um médico, o que não é verdade. Não se pode questionar que os saberes médicos são importantes e em alguns casos, imprescindíveis para que criança e mãe tenham o menor risco, mas isso não é a regra geral. Para a grande maioria dos casos (85% deles segundo a OMS) o parto pode acontecer de maneira natural, sem as intervenções medico-cirúgicas que hoje predominam, especialmente no Brasil.
O que a Casa de Parto viabilizava, e ainda viabiliza nos municípios onde puderam continuar seu trabalho, é algo muito caro para nós mulheres: a possibilidade de recuperarmos alguns saberes que tínhamos sobre a gravidez, o parto e a maternidade. Saberes que fomos perdendo para a medicina superespecializada que hoje se acha a única sabedora dos mistérios da vida e da morte. Não é! Se não resgatarmos este saber perdido, é bem possível que num futuro próximo, nós mulheres comecemos a acreditar que essa idéia de gerar uma criança no próprio ventre seja ultrapassada, arriscada demais para nós e os bebês.
Instituições como as Casas de Parto, que entendem as mulheres como seres humanos integrais, ativas, desejantes, que tem seus próprios saberes e concepções sobre a maternidade, e não como meras “pacientes”, são instituições extremamente subversivas e de difícil aceitação. Não tem sido diferente para aquelas que conseguiram sobreviver aos bombardeios do poder da medicina. Lamentavelmente a nossa sucumbiu.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Nossa imperfeita e impura democracia

Por: Rita de Cássia A Almeida


As eleições municipais se avizinham e já tenho ouvido muita gente praguejando pelo fato de ter que comparecer às urnas novamente. O discurso da desilusão com nossos representantes tem sustentado uma conclusão muito recorrente: a de que não vale a pena votar. Tudo bem que nós brasileiros temos experimentado uma relação, digamos, “traumática” com a democracia, mas como se diz por aí: “é preciso ter cuidado para não jogar fora o bebê junto com a água suja da bacia”.

É atribuída a Winston Churchill, estadista inglês, a seguinte frase: “A democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos". Então concordamos que a democracia seja mesmo imperfeita, tenha suas limitações e muitos problemas, mas de fato, ainda não se inventou nada melhor. Um destes problemas se deve ao fato da tão vangloriada “escolha da maioria” poder se transformar numa “bomba relógio” que mais adiante vai cair no nosso colo. No entanto, isso não é justificativa para cuspirmos nas urnas. Cuspir nas urnas é cuspir na história, é cuspir na dedicação e no trabalho daqueles que lutaram, muitas vezes com suas vidas, para que pudéssemos fazer nossas próprias escolhas, ainda que, por vezes, atrapalhadas.

Então façamos nossas escolhas mais uma vez, e com orgulho, mas não sem uma certa dose de indignação, que se faz bastante saudável para que tenhamos critérios cada vez melhores, que reduzam cada vez mais nossa margem de erro. Eu tenho algumas sugestões a dar:
Primeiramente se dedique realmente à escolha de seu candidato: se informe, troque opiniões com seus pares, pesquise, desconfie, observe e se for possível converse com seus pretendentes. Não decida rápido demais e nem deixe pra última hora, em qualquer decisão apressada o risco de se equivocar é muito maior. Outra dica importante: não troque seu voto por nada. Seja por promessa de emprego, por saco de cimento, bolsa de estudos ou qualquer outra suposta benesse individual. Você pode ter certeza que o cidadão que é capaz de comprar seu voto, também será capaz de vendê-lo na próxima esquina, por qualquer oferta que ele considere melhor.

Mas ainda sim, com todo este cuidado, é inevitável que cometamos erros, mas aí vem o lado bom da democracia, a cada quatro anos temos a oportunidade de tentar repará-los e cada vez com mais experiência e conhecimento de causa. Ulysses Guimarães, um dos ferrenhos defensores da nossa democracia dizia o seguinte: "A grande força da democracia é confessar-se falível de imperfeição e impureza, o que não acontece com os sistemas totalitários, que se autopromovem em perfeitos e oniscientes para que sejam irresponsáveis e onipotentes." Então, vamos lá! Sacudir a poeira e exercitar mais uma vez nossa imperfeita e impura democracia.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A sociedade dos excessos

Por: Rita de Cássia de Araújo Almeida


Em entrevista recente, o juiz Fausto De Sanctis da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, responsável pela prisão de Daniel Dantas, Celso Pitta e de Naji Nahas, ao comentar resultados de estudos sobre a criminalidade afirmou o seguinte: “...o crime realmente é elevado por conta do excesso das pessoas, não das carências. Quanto mais têm, mais querem. O crime em geral se dá pelo excesso, porque as pessoas que têm menos têm tido postura mais digna que as que têm mais”.
Não me surpreendi com a afirmação deste ilustre Juiz. Estamos mesmo na era dos excessos e são estes excessos que ameaçam a vida em sociedade e nossa existência neste planeta. A sociedade dos excessos é o reflexo de nossa economia de mercado, cujo imperativo que ecoa em uníssono é: consuma! Consuma muito, qualquer coisa e a todo tempo! Alimentos, remédios e bebidas alcoólicas. Imagens, modas e informações. Cursos, capacitações e especializações. Drogas, cirurgias plásticas, felicidade e dietas. Sexo, prazer e extravagâncias. Eletrodomésticos, tecnologias, comodidades e luxo. Enfim, consuma qualquer coisa e, principalmente, consuma em excesso!
Muito me preocupa essa nossa vida de excessos, dos excessos nos quais estão mergulhados os nossos filhos. Eu tenho três e tenho tentado ir, o tanto quanto possível, na contramão destes excessos, tentando educá-los de modo que possam suportar as privações sem grandes angústias. Adio e, sempre que posso, resisto à tentação de comprar o que me pedem, mesmo podendo. Procuro educá-los longe das preocupações com moda e beleza e prefiro os bens duráveis aos descartáveis. Não permito que a TV determine nossa rotina familiar. Nos finais de semana e feriados, quase sempre vamos pra “roça” ou para outros lugares de contato maior com a natureza e onde as privações também são maiores. Evito os shoppings e os restaurantes. Sempre que eles me dizem que precisam de alguma coisa, eu intervenho, e os levo a pensar se realmente precisam daquilo ou se na verdade querem aquilo. Se avaliam que não precisam da tal coisa, então combino que podemos planejar e adiar a compra, e o que acontece, geralmente, é que, na semana seguinte, o querer já é outro.
Também vejo com reserva esta filosofia, muito útil ao consumismo desenfreado, de que o importante é viver o momento. Não é por acaso que o slogan da propaganda de certo cartão de crédito é: “porque a vida é agora”. A mensagem é clara: Compre agora! Não importa o que passou, nem como você fará para pagar a conta depois. O risco é grande de cultivarmos um imediatismo superficial por ser carente de passado, e também irresponsável, por não ter compromisso com o futuro.
O fato é que tenho sido uma “mãe má”, capaz de privar meus filhos daquilo que querem para possibilitar que eles desejem. Ah sim! Desejar é muito diferente de querer! Só desejamos o que não podemos comprar. Espero assim, estar contribuindo com este nosso mundo formando seres humanos e não consumidores, sujeitos menos escravos do querer e mais livres para desejar.

domingo, 27 de julho de 2008

Ética na publicidade

Por: Rita de Cássia de A Almeida

Assisti, estarrecida, à cobertura da imprensa televisiva ao IV Congresso Brasileiro de Publicidade, ocorrido na semana passada. Foi lamentável escutar o posicionamento dos nossos publicitários, figurados dentre os mais competentes e inteligentes do mundo, de que regulamentar a publicidade é afrontar os princípios do Estado Democrático. A mim não conseguiram vender este discurso. Estabelecer regras, não coloca em risco a democracia, como tentaram nos fazer crer os publicitários. É preciso dizer, em alto e bom tom, que o que distingue a democracia de outras formas de governo não é a ausência de regras, mas sim quem as estabelece.
Num Estado Totalitário, por exemplo, uma pessoa ou um grupo de pessoas define as regras às quais os demais deverão se submeter. Num Estado Democrático, as regras continuam a existir, no entanto, é a sociedade, através dos instrumentos democráticos, que define estas regras, ou seja, é o interesse coletivo e não o individual que é levado em questão. Outra particularidade da democracia é que tais regras não são perenes ou imutáveis, podem e devem ser modificadas, de acordo com a época, a situação e os interesses da sociedade.
Se o mercado publicitário brasileiro quer mesmo defender a democracia, que então escute a sociedade, ao invés de defender apenas seus próprios interesses corporativos. Façam uma pesquisa, sei que são muito bons nisso! Perguntem aos pais e mães de família se eles gostariam que seus filhos pudessem ter acesso a qualquer tipo de programa na TV, em qualquer horário, sem nenhuma preocupação com o conteúdo exibido? Perguntem aos que lutam para abandonar o vício do álcool se eles não gostariam que seus entes queridos tivessem a oportunidade de serem mais críticos ao assistirem um “inofensivo” comercial de cerveja? Perguntem aos defensores das causas ambientais o que eles acham das propagandas que nos dizem o tempo todo: consumam, consumam e entupam o planeta com seu lixo, mas sejam felizes agora? Perguntem às entidades de vítimas do fumo se eles não aplaudiram as restrições feitas às propagandas de cigarro? Perguntem aos especialistas em saúde pública o que eles acham das propagandas de remédio que estimulam a auto-medicação? Perguntem aos endividados dos cartões de crédito, se eles não gostariam de terem sido melhor informados sobre os perigos do crédito fácil?
Se os publicitários realmente defendem a democracia, que escutem a sociedade, certamente ela terá razões éticas irrefutáveis para defender certas regras, saudáveis e necessárias a toda e qualquer civilização, sociedade, instituição, profissão e por aí vai... O nosso desejo mais primário e íntimo é viver sem regras, satisfazer aos nossos impulsos e os outros que se danem. Mas como diria o velho Freud (infelizmente denegrido pela má publicidade) o homem só foi capaz de fundar a civilização quando foi capaz de renunciar aos próprios instintos em favor da coletividade. Meu pai diria assim: _ Minha filha, o fato de você poder dizer tudo o que quer, não lhe dá o direito de dizer tudo o que quer.

domingo, 22 de junho de 2008

Dois pesos, duas medidas.

Por: Rita de Cássia A Almeida

Sou profissional liberal e há alguns anos atrás, me inscrevi num processo de seleção para me conveniar a uma instituição de saúde. Dentre as documentações que me foram exigidas constavam: estar em dia com meu Conselho Profissional, com a Receita Federal e com minhas obrigações eleitorais (e se fosse homem, também com meus deveres com a Pátria), certidão negativa nas esferas municipal, estadual e federal e certidão de bons antecedentes, emitida pela delegacia de polícia. Na ocasião, achei normal esta espécie de procedimento, afinal, creio em valores como cumprimento de deveres, legalidade e honestidade. Anos depois, ao tentar comprar um celular, tive uma terrível surpresa: meu nome estava no SPC há vários meses sem que eu soubesse. Depois de me informar no Serviço de Proteção ao Crédito, descobri que minha pendência se tratava de uma conta telefônica que não foi paga por uma inquilina quando, infelizmente, a tal conta ainda estava em meu nome. Ela, a inquilina que já havia saído do imóvel, provavelmente recebia os avisos de cobrança em seu endereço e não me repassava. Não é necessário dizer que o prejuízo foi todo meu, sem contar o constrangimento na hora da compra do celular que afinal precisou ser comprado em nome do meu marido, mas ainda assim pensei: “Descuido meu deixar num apartamento alugado a conta do telefone em meu nome, que isso me sirva de lição”. Hoje, ao me lembrar destas duas situações, fico completamente indignada, sem compreender a dificuldade do TSE em criar uma maneira de impugnar ou pelo menos restringir a candidatura de cidadãos que estejam com a “ficha suja”. Eu, cidadã comum, certamente não conseguiria me conveniar àquela instituição se apresentasse algum tipo de pendência. No caso do SPC, fiquei impedida de comprar a crédito, alugar imóvel, abrir conta bancária, fazer empréstimo, dentre outras restrições, até conseguir sanar a dívida que me foi imputada, com juros e correção. Entretanto, para os homens públicos do nosso país, a história é outra. Se aproveitando da lentidão da justiça e da falta de leis mais rigorosas, sujeitos reiteradamente envolvidos em escândalos de desvio de verbas, corrupção e sonegação, permanecem elegíveis, se mantendo na confortável posição de “lobos cuidando de galinheiros”. Foi isso que, lamentavelmente, aconteceu em nosso município. Bejani que já na sua primeira gestão deu mostras de como faz uso dos votos e da confiança que o povo lhe deposita, sequer deveria ter sido aceito como candidato à prefeitura municipal uma segunda vez. A sociedade brasileira não agüenta mais tanta corrupção. Basta! Alguém, por favor, me faça entender, porque o TSE permite que certos cidadãos, atolados até o pescoço na lama da corrupção, continuem a freqüentar os palanques eleitorais? Até quando será permitido que participem do processo eleitoral, estes criminosos, a meu ver da pior espécie, que usam dinheiro público a seu bel prazer, dando a eles a possibilidade de receberem as chaves do cofre e o poder públicos?

sexta-feira, 9 de maio de 2008

A “novela Ronaldo”

Por: Rita de Cássia de A Almeida


Esta semana os holofotes de desviaram, um pouco, do “caso Isabela” para o “caso Ronaldo/Fenômeno”. A imprensa descobriu que dar um tom novelístico para as matérias rende pontos na guerra da audiência, sendo assim, a “novela Ronaldo”, deve ainda durar alguns dias, até que outra “novela” se instale. Neste mundo de imagens, onde o que importa não é ser ou nem mesmo ter, o que importa é parecer ser e parecer ter, Ronaldo nos escandaliza porque faz cair uma imagem, imagem que tínhamos dele, produzida pela mídia, pela sua posição de garoto propaganda, e por nós mesmos que não cansamos de procurar por heróis. Na era das cirurgias plásticas, do fotoshop, da ojeriza completa à celulite, ao peito caído, às rugas, qualquer espécie de retoque para ficar bem na fita fica aprovado, seja ele qual for. Mas este é o problema das coisas que construímos com imagens, elas se desfazem ao mínimo abalo porque não têm consistência, ou melhor, nem mesmo têm a pretensão de terem consistência. Por isso, rapidamente, a imprensa divulga que Ronaldo corre o risco de perder contratos milionários de publicidade, e o UNICEF tratou rapidamente de veicular que Ronaldo não é seu embaixador, afinal, ninguém quer ser associado a um “sujeito que se envolve com travestis”. Sem contar o quanto de preconceito que esta proposição carrega e sem entrar do mérito do caso, o que me chama a atenção é a rapidez com que uma imagem se desfaz. E vou confessar, não sem uma certa dose de pudor, que sinto certa simpatia por sujeitos feito Ronaldo, e temos muitos outros exemplos de “celebridades” que seguidamente se envolvem em algum “escândalo” porque ousam fazer coisas que não condizem com a imagem que fizeram delas. É claro que Ronaldo não planejou isso conscientemente, ninguém em sã consciência, arrisca a jogar pelo ralo 20.000.000, 00 de dólares (valor que recebe em publicidade por ano) pra “tirar uma” no motel. Mas isso deixa o fato mais interessante, porque nos indica que por mais que se insista em maquiar ou produzir uma imagem de bom moço e herói, o sujeito, aquele de carne e osso, como qualquer mortal, comparece com sua verdade, cheia de estranhezas, incomposturas, deslizes e pecados. Não quero dizer com isso que abomino os bons moços e boas moças, até porque não acredito que ninguém seja totalmente bom ou totalmente mau, o que abomino é esta produção de bons moços e boas moças, belos e belas, regadas a maquiagens, plásticas, retoques e muita, muita hipocrisia, e a cegueira da maioria das pessoas para enxergar estas produções como toscas e medíocres. Eu não tenho acompanhado o “caso Ronaldo”, não sei qual foi o tom das explicações que ele deu sobre o fato, mas minha simpatia por ele aumentaria se soubesse que ele esteja deixando falar o Ronaldo, se esquivando o tanto quanto for possível do Fenômeno. Numa época onde impera a hipocrisia, momentos, ou ainda que relances de autenticidade precisam ser valorizados, pois são uma raridade.