Eu também amo a Luciana Genro e o Eduardo Jorge! Adoraria viver num Brasil onde o discurso deles não fosse possível apenas porque sabem que não tem chance de ganhar. Ou seja, adoraria que suas propostas representassem a realidade do pensamento de uma fatia grande de brasileiros. O discurso de Luciana e Eduardo habitam o meu ideal de Brasil.
Todavia, não se faz política com o ideal, mas com o real. Também não se faz política apenas com os iguais, os que pensam ou tem direções semelhantes. A política nasceu exatamente para evitar a guerra, para negociar acordos diante de posições divergentes, para tentar um caminho comum possível diante da diversidade de interesses e opiniões. A política está para a linguagem assim como a guerra está para a passagem ao ato. Fazemos uso da linguagem para não partirmos para as "vias de fato" e fazemos uso da política para não partirmos pra guerra.
Sendo assim, Luciana e Eduardo são fundamentais para o debate político, mas precisamos ter clareza de que só podem ser tão originais porque são feitos para provocar e levantar os temas polêmicos e não necessariamente para possibilitar uma via política possível dentro da nossa realidade brasileira atual. Para dar um exemplo, segundo uma pesquisa recente do Ibope, quase 80% da população é contrária à legalização do aborto ou das drogas e a favor da redução da maioridade penal e 53% não apoiam as bandeiras do movimento gay. Ou seja, se Luciana e Eduardo quisessem mesmo serem eleitos, infelizmente, não poderiam ser tão claros e diretos em suas convicções e teriam, sim que negociar apoio e parcerias com os que têm pensamentos divergentes deles o que, certamente, contaminaria suas propostas e projetos. E entendam, isso não seria necessariamente uma traição ou canalhice, mas simplesmente modos de alcançar o que é possível dentro daquilo que se pensa ser o ideal; é dessa matéria prima que se faz a política.
Enfim, a política é pura poesia quando é feita entre iguais, mas só é mesmo fundamental quando é feita com os diferentes. E esse é o grande desafio.
segunda-feira, 29 de setembro de 2014
quinta-feira, 25 de setembro de 2014
Do que eu me libertei
por Rita Almeida
A liberdade sempre foi um tema muito caro para mim. Minhas opções políticas, filosóficas e religiosas, sempre tiveram a liberdade como diretriz. Minha vida profissional é toda dedicada à liberdade. Mas apesar das grandes liberdades serem a pauta da minha vida, foi na conquista de algumas pequenas liberdades cotidianas que eu encontrei o que procurava.
Eu me libertei da culpa por sair de casa e deixar a cama desarrumada de manhã
Eu me libertei do carro para minhas tarefas do dia a dia
Eu me libertei da pressa para a chegada do final de semana
Eu me libertei do nojo de biscoito que caiu no chão e de lambida de cachorro
Eu me libertei do excesso de preocupação para lembrar de colocar a escova de dente na mala
Eu me libertei do medo de abrir as contas no final do mês
Eu me libertei do medo de sentir medo
Eu me libertei da raiva com as burocracias tolas e desnecessárias, desnecessárias até para merecerem minha raiva
Eu me libertei da necessidade de me queixar com alguém que não seja o atendente de algum SAC
Eu me libertei da vontade de conversar na cama
Eu me libertei da necessidade de falar quando não há nada a ser dito
Eu me libertei do ciúme
Eu me libertei do “espelho, espelho meu...”
Eu me libertei da obrigação de ficar feliz quando estou triste
Eu me libertei do medo de errar ao fazer uma receita pela primeira vez
Eu me libertei da culpa por cometer pequenos pecados como: tomar coca-cola, comer batatas fritas, fumar um cigarro de palha ou gastar demais com um sofá novo.
Eu me libertei da culpa por conseguir passar um dia todo dedicada ao nada
Eu me libertei da necessidade de remoer o passado e da ansiedade em saber do futuro
Eu me libertei das inibições do meu corpo
Eu me libertei da vontade de saber demais
Eu me libertei da prepotência de acreditar que posso salvar todos os cachorros e gatos abandonados da rua ou todos os abandonados do mundo
Eu me libertei da arrogância de sempre saber o que é melhor
Eu me libertei da necessidade de ter o controle sobre tudo
Eu me libertei do medo de dizer não
Eu me libertei do imperativo de ter que tirar uma teia de aranha do teto assim que a vi
Eu me libertei da necessidade de atender as expectativas dos outros ou achar que os outros devem ser como eu gostaria que fossem
Eu me libertei de ter que colocar condições para amar
Eu me libertei das tendências da moda
Eu me libertei do secador de cabelos, da escova e da chapinha
Eu me libertei da preocupação em sair estranha na foto
Eu me libertei da prisão que é se achar insubstituível
Eu me libertei da vergonha ao admitir que fui ridícula
Eu me libertei da vontade de ajeitar os quadros na parede quando estou na casa de um amigo
Eu me libertei da culpa por rejeitar uma ligação
Eu me libertei da ideia de que ficar acordada durante a noite pensando, será capaz de me ajudar a resolver um problema ou proteger meus filhos que estão na rua
Eu me libertei da necessidade de criar uma conversa mental antes que a conversa real aconteça
Eu me libertei da necessidade de ouvir desculpas
Eu me libertei do medo de perder
Eu me libertei do desejo de entender a morte
Eu me libertei do interesse em ser especial para Deus, para meus pais, para meu chefe ou para meu analista, porque viver já é especial o suficiente.
A liberdade sempre foi um tema muito caro para mim. Minhas opções políticas, filosóficas e religiosas, sempre tiveram a liberdade como diretriz. Minha vida profissional é toda dedicada à liberdade. Mas apesar das grandes liberdades serem a pauta da minha vida, foi na conquista de algumas pequenas liberdades cotidianas que eu encontrei o que procurava.
Eu me libertei da culpa por sair de casa e deixar a cama desarrumada de manhã
Eu me libertei do carro para minhas tarefas do dia a dia
Eu me libertei da pressa para a chegada do final de semana
Eu me libertei do nojo de biscoito que caiu no chão e de lambida de cachorro
Eu me libertei do excesso de preocupação para lembrar de colocar a escova de dente na mala
Eu me libertei do medo de abrir as contas no final do mês
Eu me libertei do medo de sentir medo
Eu me libertei da raiva com as burocracias tolas e desnecessárias, desnecessárias até para merecerem minha raiva
Eu me libertei da necessidade de me queixar com alguém que não seja o atendente de algum SAC
Eu me libertei da vontade de conversar na cama
Eu me libertei da necessidade de falar quando não há nada a ser dito
Eu me libertei do ciúme
Eu me libertei do “espelho, espelho meu...”
Eu me libertei da obrigação de ficar feliz quando estou triste
Eu me libertei do medo de errar ao fazer uma receita pela primeira vez
Eu me libertei da culpa por cometer pequenos pecados como: tomar coca-cola, comer batatas fritas, fumar um cigarro de palha ou gastar demais com um sofá novo.
Eu me libertei da culpa por conseguir passar um dia todo dedicada ao nada
Eu me libertei da necessidade de remoer o passado e da ansiedade em saber do futuro
Eu me libertei das inibições do meu corpo
Eu me libertei da vontade de saber demais
Eu me libertei da prepotência de acreditar que posso salvar todos os cachorros e gatos abandonados da rua ou todos os abandonados do mundo
Eu me libertei da arrogância de sempre saber o que é melhor
Eu me libertei da necessidade de ter o controle sobre tudo
Eu me libertei do medo de dizer não
Eu me libertei do imperativo de ter que tirar uma teia de aranha do teto assim que a vi
Eu me libertei da necessidade de atender as expectativas dos outros ou achar que os outros devem ser como eu gostaria que fossem
Eu me libertei de ter que colocar condições para amar
Eu me libertei das tendências da moda
Eu me libertei do secador de cabelos, da escova e da chapinha
Eu me libertei da preocupação em sair estranha na foto
Eu me libertei da prisão que é se achar insubstituível
Eu me libertei da vergonha ao admitir que fui ridícula
Eu me libertei da vontade de ajeitar os quadros na parede quando estou na casa de um amigo
Eu me libertei da culpa por rejeitar uma ligação
Eu me libertei da ideia de que ficar acordada durante a noite pensando, será capaz de me ajudar a resolver um problema ou proteger meus filhos que estão na rua
Eu me libertei da necessidade de criar uma conversa mental antes que a conversa real aconteça
Eu me libertei da necessidade de ouvir desculpas
Eu me libertei do medo de perder
Eu me libertei do desejo de entender a morte
Eu me libertei do interesse em ser especial para Deus, para meus pais, para meu chefe ou para meu analista, porque viver já é especial o suficiente.
segunda-feira, 18 de agosto de 2014
Política de saúde para álcool e outras drogas: tratamento ou salvação?
Por Rita de Cássia de A. Almeida
Psicóloga/psicanalista da Rede de Saúde Mental do SUS
A questão da participação das Comunidades Terapêuticas como atores no tratamento das dependências de álcool e outras drogas tem sido um nó para nossa política de saúde mental. Longos e árduos anos de debates, trabalho e militância ativa de familiares, trabalhadores e usuários culminaram da desconstrução progressiva (e que ainda está em curso) de um modelo de tratamento que sempre priorizou e valorizou as longas internações e o isolamento social. Assim sendo, a noção de que as Comunidades Terapêuticas têm se configurado como um passo atrás naquilo que a Reforma Psiquiátrica Brasileira conquistou ao longo das últimas décadas precisa ser considerado, para que não cometamos os mesmo erros de outrora.
Mas além de reinaugurar o isolamento sócio familiar como método de intervenção, as Comunidades Terapêuticas, posto que a grande maioria delas é coordenada e mantida por instituições religiosas, criam uma delicada confusão entre tratamento e salvação. Por considerar que, para ocorrer o tratamento, a salvação espiritual e a crença ou aceitação de Deus/Jesus sejam fundamentais, grande parte dessas instituições se pautam em discursos morais e religiosos que não deveriam ser confundidos com o tratamento em si.
Dias atrás ministrei algumas aulas em uma pós-graduação em saúde mental e, dada a ementa proposta no módulo, o tema das Comunidades Terapêuticas foi inevitável. Na turma havia alunos que, inclusive, trabalhavam nessas instâncias, o que enriqueceu e acalorou bastante as discussões. A defesa pela presença das Comunidades Terapêuticas no cuidado de pessoas com problemas relacionados ao uso de álcool e outras drogas se pautou basicamente na seguinte premissa: elas funcionam em muitos casos.
Meu percurso de 17 anos trabalhando e militando no campo da saúde mental do SUS tem mostrado que as vias possíveis de recuperação e tratamento dos casos de dependência de drogas são múltiplas e diversas. Conheço pessoas que se recuperaram tratando no CAPS ou em outro tipo de serviço ambulatorial. Conheço casos em que a participação em grupos de mutuo ajuda, do tipo AA e NA foram suficientes, sem nem mesmo a necessidade de um serviço de saúde de suporte. Também acompanhei casos em que uma internação em Hospital Geral, numa Comunidade Terapêutica ou mesmo em um Hospital Psiquiátrico, teve efeito terapêutico.
Mas também acompanhei casos onde a vinculação da pessoa a uma religião com códigos morais mais rígidos foi suficiente para uma mudança de comportamento, e casos onde uma eventual prisão ou intervenção judicial (muitas vezes por conseqüência dos efeitos ou do envolvimento com as drogas) também serviu como elemento transformador. Também não é incomum que o aparecimento de uma doença grave, que coloca o sujeito diante da morte, produza um efeito terapêutico que todas as tentativas anteriores não produziram. Quem não assistiu ao filme Clube de Compras Dallas, que assista! E vale lembrar, que a história de Ron, que faz uma virada em sua vida depois de contrair HIV, não é ficção, é real.
Também recomendo o Especial produzido pela HBO: Verdade Fora de Disputa, programa estrelado por Mike Tyson e dirigido por Spike Lee, onde Tyson conta sua trajetória de vida, incluindo seu problema relacionado com álcool e cocaína. No relato do pugilista sua prisão em 1992 foi a responsável pela conversão ao Islamismo e pela subsequente libertação das drogas. O depoimento de Tyson é fundamental para compreendermos a diversidade de discursos que podem figurar como “salvadoras” para o sujeito diante da dependência de drogas. Ou seja, assim como Jesus, Alá também pode salvar.
O fato é que ninguém pode menosprezar ou questionar o efeito terapêutico de nenhuma intervenção ou evento, especialmente quando o próprio sujeito significa tal evento como seu ponto de virada, como sua cura ou mesmo salvação. E quanto mais o adoecimento do sujeito é atravessado pelo campo da subjetividade, tanto mais essas significações são importantes no processo de tratamento e cura.
Num dos CAPS em que atuo, acompanhamos por anos o caso de M., uma dependente grave (álcool, cocaína e crack) para a qual já tínhamos tentado todas as intervenções possíveis, inclusive as de internação. Seu problema com as drogas a levou a cometer pequenos delitos e a se envolver com o tráfico para sustentar o próprio vicio, motivo pelo qual ficou detida por duas vezes. M. teve dois filhos que foram praticamente criados pela avó (mãe de M.). Uma de suas filhas R., que vimos crescer durante o processo de tratamento, mostrou-se tão madura que, quando adolescente, acabou por assumir funções de cuidar da mãe, ao invés de ser cuidada por ela. O tratamento de M. seguia entre pequenas melhoras e grandes e nocivas recaídas até que R. (filha de M.) engravidou e deu a luz a uma criança com problemas graves de saúde. R. que se mostrava tão madura e responsável não reagiu bem à situação e caiu em depressão. Quando achávamos que M. sucumbiria diante do novo desenho familiar, eis que ela simplesmente renasce, ressignifica completamente sua posição diante das drogas e não só se afasta delas, como passa a ser aquela que vai cuidar do neto e da filha. Na construção de sentido de M., seu neto nasceu com problemas exatamente para que ela se libertasse das drogas.
Podemos nos reportar ou construir uma dezena de teorias “psi” para explicar como se deu a entrada deste bebê na dinâmica de M. e sua família, e de como isso fez com que a droga deixasse de ocupar o centro da vida de M., entretanto, não podemos de forma nenhuma menosprezar a construção feita por ela: que a doença do neto foi sua porta de saída das drogas. Quem sou eu, ou quem somos nós para questionar e desprezar a construção de M.? Quem somos nós para questionar o sentido que Tyson deu para a sua prisão e conversão ao Islamismo? Quem somos nós para menosprezar quando alguém nos diz que Deus ou Jesus lhe “tirou das drogas”? Quem somos nós para questionar alguém que se diz grato por ter contraído uma doença terminal ou ter sido preso, já que foi esse seu ponto de virada para o tratamento?
Não. Ninguém tem o direito de descontruir a construção de ninguém, especialmente quando ela é produto da dor, do sofrimento, do desespero ou do desejo de se curar. Sendo assim, não podemos negar que o discurso da salvação, explorado por grande parte das Comunidades Terapêuticas, tenha seu efeito de construção significante para algumas pessoas. No entanto, uma coisa é dizer que o discurso da salvação pode ser uma das portas de saída para o problema das drogas, outra coisa é assumir o discurso da salvação como norte dentro da política pública sobre álcool e outras drogas. Ou seja, o discurso da salvação ou da crença pode ter efeito terapêutico para algumas pessoas (e é obvio que tem), mas isso não quer dizer que possamos sustentar dentro da política de saúde mental, terapêuticas baseadas nesses tipos de discurso.
O discurso da salvação ou da crença podem atravessar as pessoas que fazem uso do SUS, mas não podem nortear políticas do SUS. Da mesma maneira, posso considerar que o nascimento do neto de M. com uma doença grave tenha tido efeito terapêutico em sua luta contra a dependência, mas não posso propor que “ter um neto com doença” seja diretriz política para tratamento de drogas. Assim como não podemos propor como política de drogas, a prisão, infecção por HIV e a conversão ao Cristianismo ou ao Islamismo.
Por isso, advogar que as Comunidades Terapêuticas devam participar da política de álcool e outras drogas porque sua estratégia de salvação e de conversão funciona para muitos casos, é um argumento muito frágil. Para participar do SUS é preciso muito mais do que isso, é preciso se submeter aos seus princípios e respeitar suas instâncias. Que alguns desejem e até conquistem a salvação, tudo bem! Mas que isso não seja feito em nome do SUS, já que a missão do SUS é o tratamento e seus desdobramentos: a prevenção e a reabilitação ou reinserção psicossocial.
terça-feira, 15 de julho de 2014
O futebol vive!
por Rita Almeida
Depois de uma semana melancólica para nossa seleção a única coisa que me consola é saber que o futebol vai sobreviver.
O futebol vai sobreviver na pelada dos garotos da minha rua, onde o campo é de asfalto e as traves são chinelos de dedo. Um futebol que ainda resiste ao tráfego intenso e às tecnologias virtuais.
O futebol vai sobreviver na pureza das nossas crianças pequenas, que antes mesmo de aprenderem a andar com destreza, ensaiam um chute a gol. Um ato corriqueiro por aqui, e que denuncia o quanto futebol está enraizado na nossa cultura.
O futebol vai sobreviver nas peladas de várzea que acontecem em todos os cantos desse país. Um futebol que, muitas vezes, sobra peso e falta forma física, mas que faz uma coisa fundamental: reúne amigos.
O futebol vai sobreviver, semanalmente, na Oficina de Futebol que eu coordeno no CAPS Leste, serviço de saúde mental do SUS. Nessa oficina, o futebol serve como via de tratamento e inserção psicossocial. Só quem conhece esse tipo de trabalho, sabe os milagres que a linguagem universal do futebol pode fazer.
O futebol vai sobreviver na promessa da minha filha de 7 anos. Ela me disse que quando crescer vai conseguir assistir a outros jogos de futebol, não só os da seleção brasileira. Me fez essa promessa, quando a convidei para assistir comigo a final Alemanha x Argentina.
O futebol vai sobreviver na fé do torcedor e na rivalidade das torcidas.
Enfim, o futebol vai sobreviver, porque é muito maior que essa Copa e muito maior que a seleção brasileira e os nossos clubes de futebol.
O futebol é infinitamente maior que a FIFA, a CBF, que seus dirigentes e cartolas corruptos e obscenos.
O futebol é maior que o nossas escolinhas de base medíocres, que não servem para democratizar o futebol ou fazer surgir talentos, são, muitas vezes, apenas fábricas de mercadoria humana tipo exportação.
O futebol é maior que os acordos espúrios feitos fora do campo para favorecer determinados canais de TV.
O futebol vale mais que seus patrocinadores, que o comércio que gira em torno dele. O futebol vale muito mais do que todo o dinheiro que movimenta, aqui e acolá.
Me apaixonei por futebol aos 12 anos, acompanhando pela TV, junto com meu pai, a trajetória do Flamengo na conquista do Mundial de Interclubes de 1981. Zico e Nunes se tornaram meus heróis. Aquela final com o Liverpool está entre as melhores e mais emocionantes lembranças da minha infância. Isso que eu vivi com o futebol não tem preço e nem tamanho.
Não gosto de viver de passado e também não tenho a síndrome de “meia noite em Paris”, aquela que nos faz acreditar que o passado sempre foi melhor ou mais romântico que hoje, mas confesso que tenho saudade de um futebol menos capitalista, menos pervertido pelo dinheiro e pelos lucros.
Também não faço a menor ideia de como vamos fazer para recuperar o futebol brasileiro no nível macro, depois dessa última experiência da nossa seleção brasileira. Espero, sinceramente, que o fracasso nos impulsione para uma grande mudança, assim como deve ser. O que eu sei é que no nível micro, o futebol não vai parar, porque ele, simplesmente, não pode esperar que a gente remende os cacos dessa derrota.
Hoje é domingo e amanhã pela manhã estarei com os participantes da Oficina de Futebol do CAPS Leste, fazendo nosso treino. E no mesmo clube que nos cede espaço para treinar, estarão meninos e meninas de 7 a 12 anos, que no contra turno da escola participam de uma escolinha de futebol. Experiências como essa acontecerão aos montes pelo Brasil afora, porque o futebol continua vivo, presente e forte!
Meu desejo, hoje, é que a gente não demore muito tempo para perceber que o nosso futebol não morreu. Está ferido sim, quebrado talvez, mas vivo. E tomara que a gente saiba aproveitar toda essa vitalidade para seguir em frente e numa outra direção. E tomara que a gente não espere o segundo tempo da prorrogação para reagir.
Depois de uma semana melancólica para nossa seleção a única coisa que me consola é saber que o futebol vai sobreviver.
O futebol vai sobreviver na pelada dos garotos da minha rua, onde o campo é de asfalto e as traves são chinelos de dedo. Um futebol que ainda resiste ao tráfego intenso e às tecnologias virtuais.
O futebol vai sobreviver na pureza das nossas crianças pequenas, que antes mesmo de aprenderem a andar com destreza, ensaiam um chute a gol. Um ato corriqueiro por aqui, e que denuncia o quanto futebol está enraizado na nossa cultura.
O futebol vai sobreviver nas peladas de várzea que acontecem em todos os cantos desse país. Um futebol que, muitas vezes, sobra peso e falta forma física, mas que faz uma coisa fundamental: reúne amigos.
O futebol vai sobreviver, semanalmente, na Oficina de Futebol que eu coordeno no CAPS Leste, serviço de saúde mental do SUS. Nessa oficina, o futebol serve como via de tratamento e inserção psicossocial. Só quem conhece esse tipo de trabalho, sabe os milagres que a linguagem universal do futebol pode fazer.
O futebol vai sobreviver na promessa da minha filha de 7 anos. Ela me disse que quando crescer vai conseguir assistir a outros jogos de futebol, não só os da seleção brasileira. Me fez essa promessa, quando a convidei para assistir comigo a final Alemanha x Argentina.
O futebol vai sobreviver na fé do torcedor e na rivalidade das torcidas.
Enfim, o futebol vai sobreviver, porque é muito maior que essa Copa e muito maior que a seleção brasileira e os nossos clubes de futebol.
O futebol é infinitamente maior que a FIFA, a CBF, que seus dirigentes e cartolas corruptos e obscenos.
O futebol é maior que o nossas escolinhas de base medíocres, que não servem para democratizar o futebol ou fazer surgir talentos, são, muitas vezes, apenas fábricas de mercadoria humana tipo exportação.
O futebol é maior que os acordos espúrios feitos fora do campo para favorecer determinados canais de TV.
O futebol vale mais que seus patrocinadores, que o comércio que gira em torno dele. O futebol vale muito mais do que todo o dinheiro que movimenta, aqui e acolá.
Me apaixonei por futebol aos 12 anos, acompanhando pela TV, junto com meu pai, a trajetória do Flamengo na conquista do Mundial de Interclubes de 1981. Zico e Nunes se tornaram meus heróis. Aquela final com o Liverpool está entre as melhores e mais emocionantes lembranças da minha infância. Isso que eu vivi com o futebol não tem preço e nem tamanho.
Não gosto de viver de passado e também não tenho a síndrome de “meia noite em Paris”, aquela que nos faz acreditar que o passado sempre foi melhor ou mais romântico que hoje, mas confesso que tenho saudade de um futebol menos capitalista, menos pervertido pelo dinheiro e pelos lucros.
Também não faço a menor ideia de como vamos fazer para recuperar o futebol brasileiro no nível macro, depois dessa última experiência da nossa seleção brasileira. Espero, sinceramente, que o fracasso nos impulsione para uma grande mudança, assim como deve ser. O que eu sei é que no nível micro, o futebol não vai parar, porque ele, simplesmente, não pode esperar que a gente remende os cacos dessa derrota.
Hoje é domingo e amanhã pela manhã estarei com os participantes da Oficina de Futebol do CAPS Leste, fazendo nosso treino. E no mesmo clube que nos cede espaço para treinar, estarão meninos e meninas de 7 a 12 anos, que no contra turno da escola participam de uma escolinha de futebol. Experiências como essa acontecerão aos montes pelo Brasil afora, porque o futebol continua vivo, presente e forte!
Meu desejo, hoje, é que a gente não demore muito tempo para perceber que o nosso futebol não morreu. Está ferido sim, quebrado talvez, mas vivo. E tomara que a gente saiba aproveitar toda essa vitalidade para seguir em frente e numa outra direção. E tomara que a gente não espere o segundo tempo da prorrogação para reagir.
O legado subjetivo da Copa
Por Rita de Cássia de Araújo Almeida
Ao contrário do que muitos pensam a Copa não fez de nós melhores ou piores do que já éramos. Querem ver? Listem tudo o que foi considerado um sucesso nessa Copa ou todas as mazelas que se atribuiu a ela e me digam: aparece nessa lista alguma coisa diferente do que já fazia parte da realidade brasileira?
A Copa é um acontecimento. Um acontecimento, por si só, não é capaz de nos transformar em algo para além de nós mesmos, no entanto, é capaz de evidenciar, destacar nossas peculiaridades. A vida segue sem saltos e a gente se acomoda, mas basta um acontecimento pra gente se re-conhecer e se aperfeiçoar (se soubermos aproveitar a oportunidade, é claro!).
Eu sempre fui contra o movimento #nãovaitercopa. Primeiro porque eu amo futebol e segundo porque seria negar uma oportunidade única de nos conhecermos mais enquanto nação, enquanto povo. Saber mais sobre o que somos e, obviamente, o que queremos. Eu confesso que temia o que iria ver. Tinha medo de que tudo o que diziam sobre nós fosse realmente verdade e também temi o fim dos tempos anunciado na TV, jornais e revistas.
O Mundial termina em alguns dias. Muito se diz sobre os legados econômicos e estruturais que a Copa poderá nos deixar, sejam eles positivos ou negativos. Pois eu acho que o maior legado dessa Copa é subjetivo e muito mais importante, e tem a ver com a distância abissal entre aquilo que se imaginava sobre uma Copa no Brasil e o que ela realmente tem sido. Eu estou certa de que, se a Copa no Brasil foi um sucesso apesar de tudo (da FIFA, da corrupção, das empresas e empreiteiras de péssima índole, da mídia, da política de esgoto, dos cartolas e outros) foi por causa de uma força poderosíssima que não se pode subestimar nunca mais chamada: PAIXÃO PELO FUTEBOL. Nesse caso, eu não estou falando apenas do futebol dos clubes ou do jogo jogado dentro das quatro linhas do campo, estou falando do futebol que faz parte da nossa cultura e da nossa história. O futebol está tão entranhado no DNA brasileiro que mesmo quem diz não gostar do esporte é incapaz de ficar fora de sua influência. Ou eu estou enganada?
Então, no meu entendimento, o grande legado dessa Copa, com ou sem o hexa, é que ninguém pode duvidar da capacidade do Brasil quando movido por essa grande paixão chamada futebol. Alguém disse antes da Copa que precisamos de serviços de saúde e educação de qualidade e não de Copa do Mundo. Na ocasião eu já pensava que tais investimentos não seriam excludentes, mas complementares. Mas hoje, diante da explosão positiva que foi essa Copa no Brasil eu tendo a pensar que qualquer política pública, seja ela de saúde, de segurança, de educação ou de mobilidade urbana, precisa levar em conta nossa ligação afetiva e intensa com o futebol. Através e a partir do futebol, esse esporte que nos identifica e nos representa, podemos ir muito melhor e muito mais longe. E que ninguém nunca mais duvide disso!
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