A palavra humanização anda um tanto desgastada. Vou dar a ela uma significação que me ocorreu para tentar dizer do que pretendo. Humanizar é sempre pensar alguma coisa tendo como ponto de partida os mais frágeis. Para dar um exemplo, humanizar o trânsito seria pensar a partir de pedestres e bicicletas e não dos automóveis, como normalmente se pensa. Humanizar, portanto, não é tarefa simples, é um desafio ético e político que vai na contramão do senso comum.
Humanizar a educação é pensa-la a partir dos que tem dificuldades de aprender e dos historicamente alijados de seus espaços; como negros e indígenas.
Humanizar a saúde é pensa-la a partir dos que tem a saúde mais frágil; como idosos e doentes graves.
Humanizar a cidade é toma-la a partir dos que estão à sua margem; como os moradores de rua e os doentes mentais.
Humanizar o campo é toma-lo a partir de seus habitantes mais vulneráveis; como os sem-terra e trabalhadores rurais.
Humanizar a sociedade é organiza-la a partir dos que usufruem menos de seus benefícios; como os mais pobres e excluídos.
Humanizar a segurança pública é estruturá-la a partir das maiores vítimas da violência; como os jovens, negros, mulheres e pobres.
Humanizar as leis é cria-las a partir dos que mais precisam dela para se protegerem; como mulheres, negros, gays e trabalhadores.
Humanizar a arquitetura é estrutura-la a partir dos que tem maior dificuldade de acessibilidade; como cadeirantes, deficientes físicos e idosos.
Humanizar é, portanto, estabelecer um pacto civilizatório de convivência que possa criar um mundo menos injusto e que acolha o maior número de pessoas possível. E isso vai muito além de caridade ou solidariedade. Trata-se de um compromisso ético de pensar o mundo a partir do outro, mas não de um outro que é igual a mim, mas de um outro que, pela sua fragilidade e desproporção de oportunidade, é radicalmente diferente de mim.
Humanizar é cuidar desse outro que eu naturalmente desprezaria. Não movido por piedade ou espírito cristão, mas por uma razão muito simples: quando conseguimos cuidar dos mais difíceis de serem cuidados, promovemos um lugar melhor para todos. Se tenho uma sociedade acolhedora para os que têm mais dificuldade, os demais serão naturalmente acolhidos. Por outro lado, qualquer política que faça opção apenas pelos mais fáceis de cuidar, promoverá excluídos, rejeitados e injustiçados.
A política que eu desejo, defendo e partilho é essa política para a humanização. É a política que consegue fazer com que nós enxerguemos o mundo para além dos nossos próprios interesses e vaidades. É a política que sustenta um pacto civilizatório simples: ou lutamos por uma cidade que seja boa para a grande maioria (a maior possível), ou ela não será boa para ninguém.
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