domingo, 1 de setembro de 2013
Delirar é fundamental!
Delirar é fundamental! Tão fundamental que se eu fosse uma filósofa importante mudaria a máxima cartesiana para: "Deliro, logo existo". É comum que se diga que só os loucos deliram, mas isso não é verdade. Todos nós deliramos. Quem não delira ou é pedra ou é planta. Todas as pequenas e grandes realizações humanas iniciaram com um delírio, ou seja, numa invenção da cabeça de alguém.
Quando começamos a trabalhar na saúde mental, temos muito medo do delírio. Mas depois de um tempo, entendemos que o que difere uns delírios de outros, é o simples fato de alguns deles conseguirem nos convencer de que são uma verdade possível e outros não. Ou seja, tememos o delírio quando acontece de não conseguirmos compartilhar de sua verdade. É um medo do desconhecido, apenas.
Portanto, o grande desafio enfrentado pelo delírio, ou por quem delira, é conseguir convencer outras pessoas da verdade daquele delírio. Assim também deve ter sido para Copérnico no século XV, quando afirmou que o Sol, e não a Terra, seria o centro do nosso Universo. Também foi considerado delírio quando alguns disseram ser possível tratar da loucura entre nós: sem muros, sem trancas, sem isolamento, sem exclusão. Hoje vemos que isso é totalmente possível. Isso quer dizer que um delírio é capaz de se tornar uma verdade quando, e se, tem a chance de ser compartilhado por um determinado número de pessoas; quando consegue fazer laço e lastro.
Mas ai daquele que não consegue compartilhar seu delírio! Ai daquele que não consegue fazer laço com seu delírio! Assim sendo, a missão dos novos serviços de saúde mental não manicomiais, inventados pela Reforma Psiquiátrica, tem sido, exatamente, tornar possível o delírio de muitas pessoas, aquelas que tinham seu delírio silenciado, desvalorizado e desacreditado.
E assim se resume o meu trabalho nos últimos anos: eu acredito nos delírios que ouço. Em todos eles. Porque o que aprendi nesses meus 17 anos de trabalho na saúde mental, nos vários CAPS que já trabalhei e com os inúmeros delírios que ouvi é que: não existe delírio que não possa se tornar uma verdade. Todo e qualquer delírio pode adquirir valor de verdade quando compartilhado por outras pessoas, afinal o que distingue a verdade do delírio é que a verdade é o delírio que a gente acredita e compartilha.
Então, deliremos! E botemos fé no delírio!
Rita de Cássia de A Almeida
Coordenadora do CAPS CasAberta de Lima Duarte MG
Texto em comemoração aos 10 anos do CAPS CasAberta.
30 de agosto de 2013
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